quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

O Homem Dourado

Uma desgarrada fatia de luz atravessava a janela do quarto e se inclinava sobre o colchão,coberto de travesseiros.Deserto de liberdades.Fluxo selvagem de corrosivas e risonhas mentiras.Fluxo e fluido.
A luz que vinha da sacada ia de encontro à nuca dela.Fazendo exteriorizar imperfeições da alma.Defeitos que,com tanto carinho,cultivara ao longo dos anos.E os traumas transtornantes de maliciosa euforia!
Abriu os olhos de gata ferida e moveu-se letárgica,na tentativa de reencontrar na própria pele cada palavra dita na noite anterior.Queimaduras explicitas de um passado muito recente.
Pequenos e fragmentados os instantes,pétalas de flor submersas na saliva.Delicados como uma pluma.Raras pérolas da vida,de beleza efêmera, flutuante e verdadeiramente vertiginosa.Despretensiosa.
Abraçou ao edredom com as unhas,com a força infecciosa que já não havia.Mordeu o lençol com paixão.Cheia de compaixão pela cama fria.
Atirado aos pés da cama,um homem bonito,dormindo pesado.Embriagado.Esfarelado de volúpia.E completamente desconhecido.
Sedentamente desfalecido,nessa aquarela surda e muda . Um homem dourado cintilando incansavelmente sob o miserável ventiladorzinho.
Um homem de cueca e meias rindo da dor da vulnerabilidade,enquanto adormecido de pura adoração.O espanto e o choque que a beleza causa.Que a beleza causa e cura.
Pensou em levantar e preparar-lhe um café . De todos os gestos,o mais invasivo,o mais obsceno!
Cogitou também a absoluta hipótese da negação:xispar com ele dali,aos berros e vassouradas,tão ofendida que estava,devorada de perplexidade!
Mas isso exigiria uma série de movimentos enérgicos,calafrios de raiva,tanta energia gasta presumidamente em vão.
Então abafou o soluço recém-aflorado e,passiva, atravessou a porta na ponta dos pés para não acordar a visita.
E tomou um banho gelado,seguido de chá e torradas,e foi secando ao vento a inércia dos cabelos – junto ás borboletas.
E foi voltando ao quarto, nua e vazia.Escancarou a janela,mas não abriu a cortina.
Aninhou-se nos braços dele,leve e adocicada.E adormeceu de mansinho,no ventre da boa emboscada.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Criei esse blog hoje,porque estou de saco cheio de postar em meu antigo flog-blog.Preciso escrever e lá não posto há tempos.Estou de saco cheio da antiga vida e quero exorcizar tudo numa caneca de leite transbordante de vinho.
Aliás.Vou utilizar isso, da caneca de leite transbordante de vinho, em algum conto apressado,mal escrito e mau-humorado.Mil rimas de amor e de rancor como se o conto fosse poesia.
Vou fazer o que tiver vontade,ao menos uma vez na vida?
Duvido.
A liberdade é pura utopia.Por mais aparentemente livre e independente que uma pessoa pareça,ela não passa de mero fantoche.Desprovida de tudo.Invadida e violada por todos,SEMPRE.
LIMITADA na superficie e na profundeza da INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER.